O que esperar do novo prefeito de Belém?

Cientistas políticos comentam sobre o perfil dos candidatos Edmilson Rodrigues e Everaldo Eguchi, o que os eleitores esperam de cada um, planos de governo e relação com a câmara de vereadores

Na eleição para prefeito, disputada na pandemia, o espaço para o eleitor decidir seu voto no segundo turno é curto, duas semanas a partir do primeiro turno, e sem o corpo a corpo dos candidatos com a população nas ruas. Em Belém, a polarização na disputa é evidente com Edmilson Rodrigues (Psol) pela esquerda e delegado federal Everaldo Eguchi (Patriota), pela direita. No primeiro turno, o psolista angariou 248.751 votos (34,22%), enquanto o patriota 167.599 votos (23,06%).

Na campanha a distância, os postulantes à Prefeitura de Belém tentam atrair os votos de eleitores dos candidatos derrotados no primeiro turno e dos indecisos ou que se ausentaram, votaram em branco/anularam o voto, enquanto a população decide se elege alguém já conhecido no meio político como Edmilson, que foi gestor da capital entre 1997 e 2004, por dois mandatos; ou aposta em Eguchi, como a novidade que segue a linha de campanha semelhante a do atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido), pautada no conservadorismo, religião e nacionalismo.

Para ajudar a traçar um panorama político da situação, o Diário do Pará conversou com três cientistas políticos – Karen Gabriely Santos, mestre em ciência política e graduada em ciências sociais pela Universidade Federal do Pará (UFPA); Tienay Costa, internacionalista, mestre em ciência política e doutoranda em desenvolvimento socioambiental pela Federal paraense; e Paulo Ribeiro, cientista social, professor e mestre em ciência política também pela UFPA. Os três cientistas analisaram a disputa, o resultado do primeiro turno, as propostas dos dois candidatos e o que esperar da eventual gestão de cada um deles.

Sobre o segundo turno, Karen Santos pontua que “será uma eleição polarizada ideologicamente, pois os dois projetos de governo se situam em espectros opostos de organização social”, explica. “Hoje o cenário é mais favorável ao Delegado Eguchi, pois o seu índice de rejeição é mais baixo que o do candidato Edmilson Rodrigues”, acredita.

Segundo Tienay Costa, essa polarização já era esperada. “Vivemos no Brasil esse cenário de polarização que tem sido reforçado e culturalmente instituído desde 2015, desde os momentos anteriores da saída da presidente Dilma Rousseff, da prisão do ex-presidente Lula, que marcam o antipetismo, o sentimento antiesquerdista corrosivo na própria política brasileira”, explica. “Desde então, a gente tem essa polarização ideológica. Posicionamentos mais conservadores, afeitos ao nacionalismo, ao apelo religioso. E, de outro lado, ideologias progressistas, defensoras de direitos das minorias, de uma visão mais plural da sociedade”, compara.

O professor Paulo Ribeiro avalia que o resultado das urnas reflete uma “antítese”. “O eleitor optou por levar ao segundo turno dois candidatos com programas de governo diferentes, ideologias diferentes e trajetórias políticas totalmente distintas”, lembra.

EGUCHI

Delegado Eguchi
Delegado Eguchi

Quando a pergunta é sobre o que o eleitor de Eguchi e Rodrigues esperam, as expectativas também são divergentes. “Em relação ao Delegado Eguchi, credito sua ida ao segundo turno ao desejo de mudança de parte da população, que acredita que um candidato alheio ao sistema político possa fazer uma gestão moderna, eficiente e livre da corrupção”, continua Paulo. “Credito aos resquícios do Bolsonarismo em Belém a ida do delegado ao segundo turno e também à onda de marginalização da política que ainda persiste no Brasil, como se fosse possível fazer política sem o confronto de ideias”, critica.

Para Karen Santos, a agenda de governo de Eguchi, em um primeiro momento, é claramente ideológica “de um espectro que se localiza entre direita e extrema-direita. Como por exemplo a pauta anticorrupção, controle de gastos públicos e um discurso antissistema de negociação de cargos políticos”, exemplifica, ao destacar que são pautas bastante alinhadas ao executivo federal. “Essa mesma agenda conforta eleitores que não se identificaram nem com os candidatos mais jovens e nem com os que já possuíam uma vivência maior na gestão pública”, analisa.

“Ao mesmo tempo que o candidato possui um discurso liberal e antissistema, ele agrada pelo tom moderado e menos radical que por exemplo o do candidato Vavá Martins. Ele convenceu esse eleitorado pelas pautas populares, como reformar feiras e mercados, regularização de trabalhadores informais e plano de mobilidade urbana com foco na sustentabilidade”, diz. “Ao mesmo tempo que vai atraindo esse eleitorado pelas propostas, ele não deixa claro como isso será feito, uma vez que tais agendas de execução precisam passar pela negociação legislativa”, diz.

Tienay Costa chama a atenção para a inexperiência política do delegado. “Anteriormente, ele apenas foi candidato a deputado federal nas últimas eleições, mas não venceu. Então, o que se espera é que ele cumpra alguns discursos-chave na campanha eleitoral e nas aparições públicas do candidato. Discursos relacionados à anticorrupção, aumento da segurança pública, por ele ser delegado, por ele vir com um vice também que representa a ala militarista. Então, o eleitor dele se sente possivelmente representado por essas propostas, por esses anseios e é um eleitor também que busca e que segue um discurso de renovação política”.

EDMILSON

Edmilson Rodrigues
Edmilson Rodrigues

Já o eleitor de Edmilson Rodrigues, foca em uma agenda de conhecimento prévio, segundo Paulo. “Houve a aposta do eleitorado em sua grande experiência como gestor, como deputado estadual e federal e na esperança de uma administração focada em políticas públicas para os segmentos mais vulneráveis da população, como parte da juventude de Belém, os pequenos empreendedores, as famílias em situação de vulnerabilidade social e aqueles que utilizam-se dos serviços públicos municipais de saúde, educação e assistência social, uma vez que seu partido tem como foco a implementação de ações focadas para os segmentos marginalizados da sociedade”.

Tienay também faz referência à experiência com a gestão pública do candidato como aposta do eleitor do psolista. “Avançar aquilo que foi construído na sua gestão anterior e agregando também novos recursos, novas tecnologias e estratégias que não estavam presentes no final da década de 1990, início dos anos 2000”, recorda. “Esse eleitor acredita que a sua eleição consiga romper com o abandono, com o descaso que Belém sofre por 16 anos”, explica. “É a leitura de uma cidade mais plural, de um processo de tomada de decisão mais democrática”.

A lembrança dos mandatos municipais de quando Edmilson era do PT é algo que mobiliza os eleitores antigos do candidato, afirma Karen Santos. “Obras como o PSM (pronto-socorro) do Guamá, o elevado da avenida Dr. Freitas e o Ver-o-Rio são os panteões de sua candidatura, contudo no âmbito nacional tivemos uma crescente rejeição às candidaturas de esquerda, reflexo das investigações do Mensalão e da Lava-Jato”, avalia. “Convencer o eleitor mais jovem que não presenciou seus mandatos anteriores, em meio a uma crise de legitimidade da esquerda, deverá ser o foco principal do segundo turno”.

Luiz Octávio Lucas | DOL