Desde o início de novembro, uma nova onda de fumaça sufoca a cidade de Manaus (AM). No dia (03), o governador do Amazonas Wilson Lima publicou um vídeo afirmando que a fumaça é proveniente de queimadas em municípios do oeste do Pará – informação reiterada por seu secretário de Meio Ambiente.
O pesquisador Lucas Ferrante, coordenador de um projeto que monitora o desmatamento no estado, contudo, desmente as afirmações: segundo ele, a fumaça vem das proximidades da BR-319 (Manaus-Porto Velho).
Ferrante, de acordo com o site Intercept Brasil, analisou dados públicos do Instituto Nacional de Meteorologia e verificou que o Amazonas está experimentando uma calmaria de ventos, proporcionada pelo fenômeno El Niño, que também está por trás da seca histórica que atinge a região.
De acordo com o pesquisador da Universidade Federal do Amazonas, a origem da fumaça são os municípios amazonenses de Careiro e Autazes, mais especificamente as regiões próximas à chamada rodovia Manaus–Porto Velho.
Causas do fumaceiro
Reportagem publicada pelo Intercept na segunda-feira mostra que a destruição da floresta por agropecuaristas na região metropolitana de Manaus ao longo de décadas é uma das explicações para a fumaça que cobre a cidade desde outubro, segundo o Ibama.
Um levantamento com base em relatórios do órgão e do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas revelou os nomes de alguns dos desmatadores da região que contribuíram para o fumaceiro.
Para Ferrante, há uma tentativa deliberada do governo do Amazonas de desviar o foco das queimadas nessas localidades, se eximindo de fiscalizar as atividades ilegais de grilagem e pecuária que dominam as margens da rodovia.
O pesquisador tem publicado uma série de estudos em revistas científicas internacionais demonstrando que órgãos ambientais do estado evitam atuar no desmatamento na região da BR-319.
“O histórico do governo Wilson Lima é de conivência com os crimes ambientais, e agora há essa tentativa de transferência de responsabilidade para outros estados”, afirmou.
Crimes ambientais
A pavimentação da rodovia é uma agenda que vem ganhando força política nos últimos anos. Apoiado pelo governo Bolsonaro, o projeto não foi incluído no Programa de Aceleração do Crescimento da atual gestão do presidente Lula. No entanto, em agosto deste ano, ele anunciou a criação de um grupo de trabalho para discutir a medida.
A BR-319 é a única ligação por terra de Manaus ao restante do país, e o lobby do projeto insiste na sua importância para o desenvolvimento amazonense. Segundo Ferrante, entretanto, estudos independentes de viabilidade econômica têm constatado que a rodovia atenderia principalmente os setores ligados aos crimes ambientais.
Em um estudo publicado em 2021 pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia na revista Land Use Policy, o projeto monitor de desmatamento constatou que a BR-319 é um hotspot de desmatamento na Amazônia: as taxas de desmatamento ao redor da rodovia superam em três vezes a média amazônica.
“Para se ter uma ideia, a extensão de ramais ilegais supera em seis vezes a extensão da rodovia”, revelou Ferrante.