Usinas da Paz do Governo Helder são destaque nacional no combate à criminalidade no Pará.

Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública divulgados nesta quarta-feira (31), o estado do Pará fechou o ano de 2023 com queda de 2,8% nos assassinatos. Foram 2.570 homicídios, latrocínios, feminicídios e lesões corporais seguidas de morte em 2023, contra 2.646 em 2022.

Já o Rio de Janeiro teve alta de 6,14% na mesma comparação. Passando de 3.552 assassinatos, em 2022, para 3.770, em 2023. Os dados não incluem mortes por intervenção policial.

Em relação a 2017, ano mais violento no estado do Pará, em que 4.154 pessoas perderam a vida de forma violenta, os dados de 2023 representam queda de 38%. No Rio de Janeiro, a redução foi de 32% no mesmo período. 

Apesar da queda, no entanto, a taxa de assassinatos por 100 mil habitantes ainda é menor no Rio (21,3) que no Pará (28,7). 

O Blog do jornalista Octávio Guedes da Globo News mostrou que o Pará se inspirou em experiências nacionais e internacionais bem-sucedidas para criar o projeto Usinas da Paz criado no Governo Helder Barbalho e pela primeira-dama Daniela Barbalho, ação social voluntária do projeto. Entre elas, as UPPs do estado do Rio, projeto exitoso que foi jogado na lata do lixo por problemas políticos e erros (todos sanáveis) na execução. Mas nada que justifique sua descontinuidade, como a experiência do Pará comprova. Na visão do blog são três as principais diferenças entre as UPPs da Amazônia e do Rio de Janeiro.

Lição um

A polícia é a única que consegue impor a paz. Mas não é capaz de manter a paz sozinha. No Rio de Janeiro, o projeto das UPPs começava e terminava com a polícia. Só no meio do caminho, quando a pacificação começava a fazer água, criou-se a UPP Social para retirar o foco exclusivamente no domínio de território, mas já era tarde. 

Ficou famoso o desabafo do ex-secretário de segurança, Mariano Beltrame: “Estou fazendo as UPPs só com a PM”. O Pará aprendeu a lição. Uma frase do governador Helder Barbalho simboliza o aprendizado: “Não se faz Segurança Pública sem polícia. Mas não se faz Segurança Pública apenas com polícia”. 

A implantação da UPP da Amazônia é dividida em duas etapas: a fase de “choque” e a fase de “atuação integral”. Apesar do nome “choque”, a tática para se tomar o território do crime organizado é a mesma utilizada no Rio de Janeiro, com muitos policiais e sem confrontos. “No Rio havia domínio do crime sobre território. No Pará, havia predomínio do crime. Mesmo assim, copiamos a forma de retomada do território. Se a polícia entra com guerra, ela já ganha a desconfiança da população”, explica Ricardo Balestreri, responsável pela implementação do projeto em sete bairros da Região Metropolitana da capital Belém, em 2019. 

As semelhanças param por aí. Depois que o território é conquistado e a paz, imposta, a Secretaria de Segurança passa o bastão para a Secretaria Estratégica de Articulação da Cidadania. A pasta, ocupada à época da implantação por Balestreri, tem poderes de fato: coordena 36 órgãos do governo para atuar nos territórios. Para deixar bem claro: a polícia não vai embora, mas outros atores ganham protagonismo. Não fica tudo nas costas do policial. 

Nas áreas recém dominadas, são implantadas Usinas da Paz, prédios que simbolizam a presença do estado No Rio, as sede de UPP, ou batalhões de polícia, é que faziam sinalização da presença do estado.

Lição dois

Policial é um policial, não um super-herói. O Rio de Janeiro deixou nas mãos da PM a solução de muitos problemas que eram de sua atribuição. O comandante da UPP, por exemplo, era quem decidia se podia ou não ter baile ou na comunidade. 

Policiais fizeram cursos de conciliação de conflitos, uma boa medida dentro da filosofia policiamento de proximidade. Mas só funciona quando o policial não é o único responsável por resolver tudo, de briga de inquilino com proprietário por aluguel atrasado, a reclamação de consumidor e realização de bailes. 

O relato de um PM a pesquisadora Barbara Musumeci Mourão é esclarecedor: “É complicado. O meu comando gosta da mediação, só que ela me bota pra trabalhar fardado lá. Um dia eu estou mediando, no outro dia eu estou prendendo, fardado, o mesmo cidadão que eu estou atendendo como amigo. Tanto que uma vez eu prendi um lá, que ficou me perguntando: ‘você não falou que era amigo da comunidade?’ Mas ele estava com droga na pochete”. Resumo: o “mediador” prendeu o amigo porque naquele dia estava na função de policial. 

As UPP da Amazônia diluem a autoridade do policial. As demandas são encaminhadas para quem pode efetivamente resolvê-las. As usinas oferecem 70 programas, que vão desde a prestação de serviços, como a emissão de documentos, a atividades culturais e esportivas. 

No caso da briga entre inquilino e proprietário, que o PM do Rio teve que resolver sozinho como mediador, no Pará o reclamante tem acesso a assistência jurídica gratuita nas usinas.

Lição três

Os indicadores econômicos são tão importantes quanto os de segurança – Aqui vai mais uma lembrança da UPP do Rio. Como as decisões eram concentradas nas mãos do comandante do policiamento, o foco era 100% em segurança. Um exemplo: quando a Rocinha foi tomada pelas forças policiais, o comandante da UPP proibiu os bailes funks.

Dentro da lógica exclusivamente policial, ele tinha razão: os bailes tinham consumo de drogas e isso aumentava o poder econômico das quadrilhas. Ocorre que setores importantes da economia local também foram estrangulados com o fim dos bailes. Para ficar em dois exemplos, a indústria da beleza e a venda de bebidas lícitas, como o álcool. 

Os dias de baile faziam a alegria de salões de beleza na Rocinha. Eram negócios tocados por microempreendedores que viviam de trabalho honesto, não tinham qualquer ligação com o tráfico, e quebraram com a chegada da UPP. Assim como muitos donos de biroscas, que viviam da venda honesta de bebida. Além de toda a indústria cultural, jovens que trabalhavam com iluminação, montagem de palco, divulgação e que, da noite para o dia, se viram sem emprego em nome da paz. 

Um olhar mais amplo sobre o território recém ocupado deveria levar em conta a economia local. É lógico que um baile não pode ter como objetivo final a venda de entorpecentes. Como é lógico também que não se acaba com Rock in Rio porque há consumo de drogas na plateia. O desafio é legalizar e incentivar a indústria da cultura local. E legalizar significa dar condições financeiras para que os promotores dos bailes não sejam financiados pelo tráfico. 

“A retomada de território é um choque de formalização de negócios, que precisa ser acompanhado com políticas de apoio aos pequenos negócios”, definiu um estudo o economista Marcelo Nery. 

No Pará, o cardápio dos serviços oferecidos pelas usinas da Paz consta emprego e renda, microcrédito e empreendedorismo, economia solidária. 

Agora é a vez do Rio aprender com Pará. As UPPs estavam politicamente identificadas com o projeto de poder do ex-governador Sergio Cabral. A derrocada de um significou a queda de outro. Mas achar que a UPP foi um erro é um equívoco. Não insistir no que deu certo e corrigir o que deu errado é burrice ou má fé. O problema é que burrice e má fé parecem dominar o estado do Rio neste momento.

Informações: Octavio Guedes – GloboNews – G1