Diário do Pará: respeito à diversidade de opiniões.

Nesta entrevista, o empresário e administrador fala sobre a trajetória de crescimento do jornal, a adaptação a um novo público leitor e a convergência com as mídias sociais

A frente do DIÁRIO DO PARÁ desde o início dos anos 2000, o presidente do Grupo RBA, Jader Barbalho Filho, avalia sua trajetória dentro da empresa, focando em ampliar os passos e o alcance imaginado pelo avô, o político e empresário Laércio Barbalho [1918-2004], para o jornal criado por ele em 1982, à época com editorial com quase 100% de inclinação política.

Desde que assume a publicação, Jader Filho procurou trazer ao jornal uma linguagem mais acessível, com bastante responsabilidade e atenção ao que o leitor quer e mais recentemente nos tempos de pandemia o que precisa saber. Confira a entrevista completa.

São 39 anos de circulação de um jornal que tem quase a idade da democracia brasileira. Qual a contribuição do veículo para a democratização também do acesso à informação bem apurada?

R: Nesse momento em que se discute tanto a questão dos ataques que têm sido feitos à democracia, da falta de compreensão da necessidade do contraditório, o DIÁRIO tem se pautado sempre nesse espírito de publicar várias posições sobre os assuntos mais importantes. Acho que é essa diversidade de opiniões, e o respeito a ela, são importantes. As pessoas não podem ouvir só o que querem ouvir. Tem que conhecer as opiniões contrárias também. É muito importante o respeito às opiniões divergentes e a gente, obviamente, saber conviver com essa diversidade. O DIÁRIO tem um papel importantíssimo nisso, que aliás deve ser o papel de todos os veículos de imprensa; afinal de contas, quando se fala em opinião pública tem que se ter responsabilidade pela maneira como você vai levar essa informação. Todas as vezes em que a imprensa deixou de cumprir esse papel a sociedade perdeu, a civilização recuou.

O propósito que norteou a criação do DIÁRIO ainda é o mesmo, mudou, ou se aperfeiçoou ao longo do tempo? Pode-se dizer que você seguiu os passos do seu avô, fundador do jornal, ou esse caminho foi ampliado ou mesmo redirecionado?

R: Eu acho que eu ampliei a trajetória, essa é a minha opinião. O meu avô vem de uma origem em que todos os jornais eram jornais de partidos, que defendiam ideologias, que defendiam partidos. Eu me lembro que ele me contava quando ele, junto de outros companheiros de seu partido, o PSD, criaram O Liberal. Àquela altura, ligado ao [militar e político, Magalhães] Barata [1888-1959], tinha “O Estado do Pará”, fundado pelo Justo Chermont [1857-1926], que foi senador e ex-governador do Pará. Quando o DIÁRIO é criado por ele, não existe o intuito de ser um veículo comercial. Mas, sim, defender o MDB. Quando eu assumi o jornal em 1994, e de maneira mais abrangente a partir de 1998, junto com o [vice-presidente do Grupo RBA, Camilo] Centeno, com o Francisco Melo [diretor administrativo do Grupo RBA até 2020, quando faleceu] e outras pessoas, decidi ampliar essa visão e partir para o lado empresarial. Eu comecei a tirar o foco da política propriamente dita trazendo um olhar mais comercia, contratando novos jornalistas para dentro da empresa, criando novos produtos, como as revistas, o caderno de esporte o de polícia. Sempre respeitando a questão política, mas não a tendo mais como prioridade. Passamos a dar atenção à prestação de serviços ao leitor. Deixamos de lado um editorial puramente político para transformar o jornal num produto comercial. “O que o leitor quer?”, era isso que passava na minha cabeça. Eu fui procurar fora os exemplos. Eu me lembro do jornal O Dia, no Rio de janeiro, que foi uma grande inspiração; um jornal que entendeu aquela revolução da classe C, no início dos anos 2000. As aspirações eram maiores, as pessoas queriam consumir. Queriam ter informações. Foi quando optamos pela criação de uma linguagem bastante específica, de fácil compreensão, a linguagem que as pessoas usam na rua, no dia a dia. Falar com público exige falar da maneira como ele fala e apresentar o que ele procura.

Houve quem dissesse que a internet significaria o fim dos jornais impressos; o que não ocorreu por aqui, visto que o DIÁRIO se integrou a outras plataformas para ampliar seu alcance. Ao que você credita para essa aposta ter dado certo?

R: Você tem razão. Deu certo. O DIÁRIO é um case de sucesso. Você não consegue ter um veículo com o faturamento sem dar um bom resultado para os anunciantes. Ninguém investe para não ter retorno; isso para mim já é uma sinalização. Houve, sim, uma parte dos leitores que de fato migrou para a plataforma online – seja para ler o próprio jornal no digital através do DOL, nosso portal de notícias. Importante que se diga que hoje o DIÁRIO possui essas duas plataformas. O DIÁRIO e o DOL são redações muito próximas, inclusive. Por isso que, na minha ótica, da fundação do jornal para cá, o que houve foi uma ampliação. Isso lembra o advento da TV por assinatura, com pouquíssimos canais no início e pouca variedade. Hoje você tem um sem-número de canais para consumir, e ninguém assiste só um. As pessoas passaram a selecionar o que lhes interessa, como quem vai ao supermercado. É assim que funciona de maneira geral. Então temos o público do impresso, do online, e dos dois. E ganhamos inclusive um público novo, que não lia o impresso e passou a ler na plataforma online. Nesse ponto, as redes sociais são muito importantes, ajudam os veículos de imprensa. Por vezes são predatórias, de maneira até desleal, mas é preciso saber usar a seu favor.

O DIÁRIO já ganhou prêmios relacionados à qualidade gráfica, qualidade editorial e outros reconhecimentos, mas nunca deixou de investir naquilo que faz do jornal um veículo de credibilidade. O que os leitores podem esperar para o futuro?

R: Temos o dever de estarmos atentos às mudanças que o mercado exige e precisa. Os veículos têm que entender isso. Ter que se comportar como se comportam todos os outros segmentos da sociedade. Um restaurante, para obter êxito, precisa ficar atento àquilo que o seu público quer comer, certo? Sem desvirtuar, sem perder a essência. Em um jornal, oferecer aquilo que as pessoas querem ler, ouvir, sempre com responsabilidade, é esse o nosso papel. Esse é o segredo do sucesso: não perder a sua essência e nem o foco no leitor, no consumidor final.

A pandemia impôs um ritmo completamente diferente nas redações do mundo inteiro, e no DIÁRIO não foi diferente. Qual o legado, digamos assim, que essa crise deixa para o jornalismo?

R: Não vejo que há somente o problema da pandemia; a sociedade brasileira, a sociedade mundial vive uma encruzilhada. Estamos vendo diariamente todos os excessos, todas as faltas, coisas que até bem pouco tempo atrás a gente nem acreditava que poderiam acontecer. Há questionamentos sobre tudo que a gente aprendeu sobre respeito ao próximo e de entendimento sobre o comportamento da sociedade. Não só o DIÁRIO, mas todo cidadão, toda empresa está passando por um momento de transição; essa é a minha avaliação, porque determinados comportamentos com atitudes inimagináveis estão sendo vistos com frequência. É momento de refletir o antes e o depois da pandemia e o que veio junto. Essa crise, na verdade, veio catalisar algo que estava latente; e veio com muito mais força. As intolerâncias todas, de gênero, de pensamento, de opinião, de religião, política, são visíveis. Eu, pessoalmente, me preocupo muito com o futuro da sociedade brasileira.

A diversidade na condução de pautas e projetos é uma marca do jornal. Por que, em um jornal tão local, seguir essa tendência mundial em dar voz a grupos que querem falar?

R: É uma questão de entender os nichos de mercado. Àquela altura, como a concorrência no meio impresso tinha muito foco na questão nacional e internacional, procurei fazer algo diferente, colocar o foco na ascensão da classe C, com as suas diferentes vertentes de opinião.

Sobre essa capacidade de inovação, transformação, de acompanhar tudo o que está acontecendo e oferecer ao leitor e ao mercado conteúdo diferenciado para muitos setores e perfis é, de alguma forma, uma estratégia para alcançar novos/outros leitores?

R: O tempo todo. É preciso se reinventar o tempo todo. Por isso que a gente trabalha sempre com pesquisa. O meio impresso precisa entender, assim como o meio digital precisa entender: quem é esse leitor? O que ele quer? E, obviamente, oferecer. O público é mutante dos dois lados. Inteligente aquele que acompanha essa mutação e vai se adaptando. Pega esse nicho aqui, e outro ali, traz para dentro da sua empresa e ir ampliando o leque de ofertas.

Por Carol Menezes | DOL