Urgente: MP investiga compra de respiradores pulmonares por Zenaldo Coutinho.

O Ministério Público Estadual (MP-PA) já está investigando a compra de respiradores pelo prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, a preços que seriam os mais caros do Brasil, conforme mostraram denúncias feita pela imprensa paraense. Os equipamentos foram adquiridos junto à GM Serviços Comércio e Representações Eireli, em março último, para atender os pacientes da Covid-19. O prefeito chegou a pagar R$ 260 mil por ventilador pulmonar, ou mais que o dobro do que foi pago por estados e prefeituras de vários pontos do País.

A GM Serviços nasceu como uma cafeteria e hoje, segundo a Receita Federal, realizaria 35 atividades, incluindo até psicanálise. Três meses antes de vender esses equipamentos ao prefeito de Belém, ela pediu dispensa de licenciamento ambiental à Secretaria de Meio Ambiente de Ananindeua, porque a sua principal atividade era a confecção de uniformes.

A apuração do MP-PA teve início após um pedido de providências que foi protocolado lá, no último 22 de junho. Mas a Assessoria de Comunicação (Ascom) da instituição afirmou desconhecer o nome do denunciante. Disse apenas que o pedido, dois dias depois de protocolado, foi distribuído ao promotor de Justiça Evandro de Aguiar Ribeiro, da 6ª Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa. A solicitação é para que o MP-PA verifique “a conformidade de contratação emergencial realizada pelo Município de Belém”, para a aquisição desses equipamentos, diz uma nota da Ascom. Ainda segundo a nota, o caso foi recebido como Notícia de Fato (denúncia) e o promotor já enviou ofício à Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), pedindo informações. Mas, disse um assessor, ainda não houve resposta daquela secretaria.

A partir dessas informações, diz ainda a nota, “o Ministério Público do Estado acompanhará a situação e averiguação preliminar dos fatos, a fim de subsidiar eventuais providências legais cabíveis”. No último dia 30, o vereador Francisco Almeida, o “Dr Chiquinho” do PSOL de Belém, também protocolou uma Representação no MP-PA, com base nas reportagens publicadas, para a investigação da compra desses equipamentos e o possível prejuízo aos cofres públicos causado pela transação. Segundo o assessor do MP-PA, a Representação do Dr Chiquinho deverá ser juntada a esse pedido de providências já em apuração. O assessor disse, ainda, que, embora já investigue o caso, o MP-PA “tecnicamente” ainda não abriu um procedimento.

MAQUIAGEM

Como já sabemos através das denúncias de 21, 22 e 23 de junho, Zenaldo comprou esses ventiladores, em 31 de março, sem licitação e sem contrato, a um custo total de R$ 740.624,00. Segundo as notas de empenho originais que estavam no portal da Transparência, dois deles custaram R$ 260 mil; o outro, R$ 220.624,00. Em 13 de junho, o DIÁRIO começou a investigar o caso e descobriu que a Prefeitura de Naviraí, no estado do Mato Grosso do Sul, pagou apenas R$ 98 mil por um ventilador da mesma marca (Mindray), para os pacientes da Covid-19, também em 31 de março. São Paulo, o mais rico estado brasileiro, pagou, em média, R$ 183,3 mil por equipamentos semelhantes. Para o Consórcio dos Estados do Nordeste, eles custaram, em média, R$ 162,3 mil. Para o Governo do Pará, antes que ele desfizesse o negócio com a SKN do Brasil, foram R$ 126 mil por ventilador, apesar de todas as despesas de importação da China.

No entanto, na sexta-feira, 19 de junho, um blog vazou na internet a informação sobre a compra desses ventiladores a preços turbinados. E Zenaldo iniciou uma operação de guerra, para maquiar a transação. Ainda naquele dia, desapareceram do Portal da Transparência todos os contratos e despesas da Prefeitura decorrentes da Covid-19, incluindo um Mapa Consolidado com os gastos da Sesma, que mostrava a compra desses ventiladores a preços exorbitantes.

Até a parte do portal não dedicada aos gastos com a doença foi afetada: sumiram todos os contratos e despesas anteriores a 2011. Houve protestos nas redes sociais e parte da documentação voltou. Mas, na tarde de sábado, 20, o prefeito alterou as notas de empenho da compra desses produtos, no Portal da Transparência.

Ele inseriu dados nesses documentos, para que passassem a representar a aquisição de vários equipamentos. Com isso, os preços dos ventiladores baixaram para R$ 65 mil.

Alteração de documentos pode configurar crime

Ainda no domingo, 21, após a publicação da primeira reportagem da imprensa, Zenaldo distribuiu um vídeo nas redes sociais exibindo as notas de empenho alteradas e acusando todos de “fake news”. Mas, para azar dele, o copiamos toda a documentação original. E, na segunda-feira, 22, foram divulgados, lado a lado, as notas de empenho originais e as alteradas, desmentindo mais essa fake news do prefeito. Ouvimos advogados e eles disseram que a alteração desses documentos pode configurar vários crimes, que podem até levar ao afastamento do prefeito.

“Inicialmente, se cometeu falsidade ideológica e, por conseguinte, um crime para se beneficiar de algo. Pode ter-se cometido concussão, ou até prevaricação, lavagem de dinheiro, além de improbidade administrativa. Tem de saber o que se fez com esse dinheiro. E se houver um grupo organizado praticando a fraude, pode ser também associação criminosa”, disse um deles.

Além dos ventiladores pulmonares, Zenaldo também comprou da GM Serviços, sem licitação, 2 aparelhos de ultrassom, que custaram R$ 170 mil; e 1 esterilizador de peróxido de hidrogênio, para o Pronto Socorro Municipal Humberto Maradei, que ficou em R$ 298.900,00, através do Pregão 07/2020, realizado pela Sesma. A empresa também foi contemplada com uma inexigibilidade licitatória de R$ 255 mil, para a confecção de 150 mil máscaras descartáveis, para os profissionais de saúde da rede municipal. No portal da Transparência, não há empenhos em favor da empresa, entre 2013 e 2018. No ano passado, há apenas um, de R$ 60 mil, referente a um Pregão da Sesma para o fornecimento de rouparia hospitalar. Neste ano eleitoral, porém, o prefeito já empenhou em favor da GM Serviços mais de R$ 1,745 milhão, 66% por contratos sem licitação.

Empresa passou de cafeteria para venda de equipamentos

Quando foi criada, em maio de 2012, a GM Serviços (CNPJ: 15.564.580/0001-17) possuía o nome empresarial de M F Martin – ME, ficava em um ponto comercial na Cidade Nova IV, em Ananindeua, e tinha um nome de fantasia revelador sobre o que fazia: “Coffe Cake Doceria”. Mas, ao longo dos anos, passou por várias alterações societárias e, em dezembro de 2017, foi transferida para a empresária Genny Missora Yamada. Seu capital social é de R$ 400 mil. E a sua principal atividade, declarada à Junta Comercial do Pará (Jucepa) e à Receita Federal, é o comércio atacadista de instrumentos e materiais médicos, cirúrgicos, hospitalares e laboratoriais.

Mas ela possui um leque de 35 atividades, que incluem a confecção de roupas profissionais, impressão de materiais publicitários, reparação e manutenção de aparelhos e instrumentos de medida, teste e controle; eletromédicos e eletroterapêuticos, ópticos e de irradiação; instalação e manutenção elétrica, hidráulica, sanitária, de gás, de sistemas e centrais de ar condicionado, ventilação e refrigeração; comércio atacadista de alimentos, roupas e acessórios profissionais; calçados, móveis, produtos de higiene, limpeza e conservação domiciliar; equipamentos e artigos de uso pessoal e doméstico; de informática, ferragens e ferramentas, produtos químicos e petroquímicos; serviços de engenharia, limpeza de prédios e casas, atividades paisagísticas, de atendimento em pronto-socorro e urgências hospitalares; de nutrição; de psicologia e psicanálise; de fisioterapia; apoio à gestão de saúde; assistência social e lavanderia hospitalar.

São tantos e diferentes ramos, muitos que até requerem autorização, que a Receita Federal até escreveu, ao lado de algumas dessas atividades, que a empresa estava “dispensada” de alvará, mas que ela, Receita, não tem “qualquer responsabilidade” em relação a isso.

Além disso, três meses antes de vender esses ventiladores à Prefeitura de Belém, a empresa solicitou dispensa de licenciamento ambiental à Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Ananindeua porque a sua principal atividade era a confecção de uniformes. Segundo um documento do Departamento de Gestão Ambiental daquela secretaria, a dispensa foi concedida “por tratar-se de uma sala administrativa”, cuja atividade fim “é apenas de serviços de fornecimento de uniformes(…)”.